Venho pedir o seu voto
na próxima eleição para deputado.
– Mas, com o senhor,
fazem setenta e nove candidatos, que...
– Perdão: oitenta. Que
tem isto? A reforma eleitoral deu a cada eleitor toda a independência, e até
fez com que adiantássemos um passo. Em rigor, e pelo antigo sistema, há dois
modos de fazer eleição – ou por designação de um chefe ou por acordo dos eleitores
em reuniões públicas. Não contesto que o primeiro modo dá a unidade e o segundo
a liberdade do voto. Nós, porém, inventamos um terceiro meio mais próprio de
família, mais adequado aos sentimentos bons e sossegados: – a candidatura de
paróquia, de distrito, de rua, de meia rua, de casa e de meia casa... Quem é
que não tem um ou dois companheiros de escritório ou de passeio?
– Bem; pede-me o voto.
– Sim, senhor.
– Responda-me
primeiro. Que é que fazia até agora?
– Eu...?
– Sim, trabalhou com a
palavra ou com a pena, esclareceu os seus candidatos sobre as questões que lhe
interessam, opôs-se aos desmandos, louvou os acertos...
– Perdão, eu...
– Diga.
– Eu não fiz nada
disso. Não tenho que louvar nada, não sou louva-deus. Opor-me! é boa ! Opor-me
a quê ? Nunca fiz oposição.
– Mas
esclareceu...
– Nunca, senhor! Os
lacaios é que esclarecem os patrões ou as visitas: não sou lacaio. Esclarecer!
Olhe bem para mim.
–Mas, então, o que é
que o senhor quer?
– Eu quero ser
deputado.
– Para quê?
– Para ir à câmara
falar contra o ministério.
– Ah! é contra o
Dantas?
– Nem contra nem pró.
Quem é o Dantas? eu sou contra o ministério... Digo-lhe mesmo que a minha ideia
é ser ministro. Não imagina as cócegas com que fico em vendo um dos outros de
ordenanças atrás... Só Deus sabe como fico!
– Mas já calculou, já
pesou bem as dificuldades a que...
– O meu compadre Z...
diz que não gasta muito.
– Não me refiro a
isso; falo do diploma, o uso do diploma. Já pesou...
– Se já pesei? Eu não
sou balança.
– Bem, já calculou...
– Calculista? Veja lá
como fala. Não sou calculista, não quero tirar vantagens disto; graças a Deus
para ir matando a fome ainda tenho, e possuo braços. Calculista!
– Homem, custa-me
dizer o que quero. O que eu lhe pergunto é se, ao apresentar-se candidato,
refletiu no que o diploma obriga ao eleito.
– Obriga a falar.
– Só falar?
– Falar e votar.
– Nada mais?
– Obriga também a
passear, e depois se torna a falar e votar. Para isto é que eu vinha pedir-lhe
o voto, e espero que não me falte.
– Estou pronto, se o
senhor me tirar de uma dificuldade.
– Diga, diga.
– O X. pediu-me ontem
a mesma coisa, depois de ouvir as mesmas perguntas que lhe fiz, às quais
respondeu do mesmo modo. São do mesmo partido, suponho!
– Nunca: o X. é um
peralta.
– Diabo! ele diz a
mesma coisa do senhor.
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