Aos Mestres, com carinho!

Aos Mestres, com carinho!
Drummond, Vinícius, Bandeira, Quintana e Mendes Campos

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

ISIS


Jota Camelo

QUERO DANÇAR!, poema de Itárcio Ferreira



Quero dançar!

É insuportável manter este meu corpo parado, 
Por mais um minuto que seja.

Arde em mim uma chama desconhecida,
Uma alegria incalculável,
Uma fortuna, um desejo, um gosto, um mimo,
Tudo junto numa festa.

Quero dançar!

Nem mais um segundo de tristeza.

Posso parecer um louco, um bêbado, um desvairado,
Mas meu corpo clama pela liberdade,
Por um bailado, um frevo, um samba,
Por um simples toque ou batuque que seja.

Quero dançar!

Despir o meu corpo de qualquer pudor,
De qualquer regra,
Libertá-lo das amarras do medo,
Da sedentariedade, da poliomielite, da vergonha.

Incrivelmente livre, busco imitar movimentos,
Respirar, transigir, alcançar o inalcançável...

A vida... A morte!




Visitem o blog do poeta: Itárcio Ferreira, poemas

Para refletir (67)


Coral Mocambo - "Evocação Nº 1" (Nelson Ferreira)

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Effect of LSD

Elegia Nº 1, poema de Mauro Mota


Vejo-te morta. As brancas mãos pendentes. 
Delas agora, sem querer, libertas 
a alma dos gestos e, dos lábios quentes 
ainda, as frases pensadas só em certas 
tardes perdidas. Sob as entreabertas 
pálpebras, sinto, em teu olhar presentes, 
mundos de imagens que, às regiões desertas 
da morte, levarás, que a morte sentes 

fria diante de todos os apelos. 
Vejo-te morta. Viva, a cabeleira, 
teus cabelos voando! ah! teus cabelos! 

Gesto de desespero e despedida, 
para ficares de qualquer maneira 
pelos fios castanhos presa à vida.

Capiba - "Ai Se Eu Tivesse" / "Que É Que Eu Vou Dizer" / "Nos Cabelos de Rosinha" / "Modelos de Verão"

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Steve do meu coração



Ele me chegou sem eu nem querer. Vinha da rádio, num cálido dia de abril, por esses caminhos de areia que o Campeche ainda tem. Então o vi, no portão de uma casa. Chorava um chorinho miúdo, olhando pra dentro do pátio, agoniado. Era um pedacinho minúsculo de vida, todo pretinho. Estaquei diante da cena. Era de doer. Fiquei parada em frente à casa, esperando que alguém saísse para pegar o pequenino. Nada. Uma mulher finalmente assomou na janela. “Tá querendo entrar”, falei, penalizada. Ela redarguiu, seca: “Não é nosso”, e fechou a janela.

O bichinho seguiu com seu chorinho e fui andando com o coração aos pedaços. Entrei num caminho e continuei a ouvir o choro. Olhei pra trás e lá estava ele, agora olhando na minha direção. A súplica era para mim. Olhei para um lado e para outro. Ninguém. “Foda-se, vou pegar”. Voltei às pressas e peguei a bolinha preta. Aconcheguei ao coração, bem apertado. Ele cessou o choro e se apertou de encontro a mim. Vim pelos caminhos conversando e fazendo carinho. Pensava nos gatos em casa, o que achariam?

Quando cheguei e o tirei do colo a blusa estava tomada de carrapatos. Ele mesmo estava cheio dos bichinhos. Provavelmente fora abandonado há um ou dois dias, era muito bebê. Então, lá fui eu comprar remédio e comidinha de cachorro. Como já tinha um gato preto de nome Zumbi, o batizei com o nome do grande lutador sul-africano, Steve Biko. Por conta dos carrapatos ele ficou com uma sequela, uma tremurinha na perna. Mas, o demais, tudo bem. Tem sido uma adorável companhia desde então. Nove anos. Adquiriu inúmeros modos dos gatos, família que o acolheu. Dorme em cima da mesa, com a cabeça pendente, igual aos irmãos felinos. E escala o muro tal e qual.

Hoje cheguei do mercado e ele estava ali, na rua, como sempre. Fica olhando, bem paradinho, até que me reconhece, então vem pulando, balançando o rabinho. Tem nove anos, mas é um galgo. Pula o muro quantas vezes bem quer, adora a rua. Agora, que ela está calçada, virou uma perigosa armadinha. Mas, como prendê-lo? Impossível. O coração fica apertado quando ele alça o pulo e se vai. Faz um salseiro na rua, acendendo toda a cachorrada, e passa pra lá e pra cá no portão, olhando pra dentro de casa, como a dizer: ó, to aqui.

Depois, pula o muro de volta e vem esfregar a bundinha na gente, olhando com aqueles mesmos olhos doces que tinha quando o encontrei no caminho. Essas criaturinhas nos enchem de ternura.

OS POBRES, poema de William Carlos Williams


É a anarquia da pobreza
que me encanta, a velha
casa amarela de madeira recortada
em meio às novas casas de tijolo

Ou uma sacada de ferro fundido
com gradis representando ramos
folhudos de carvalho. Isso tudo combina
com as roupas das crianças

que refletem cada período e
estilo da necessidade -
Chaminés, telhados, cercas de
madeira e metal numa época

sem cercas delimitando quase
coisa alguma: o velho
de suéter e chapéu preto
a varrer a calçada -

os seus três metros de calçada
na ventania que inconstante
virou-lhe a esquina para vir
tomar conta da cidade inteira

William Carlos Williams

Tradução de José Paulo Paes 


Gift (Presente) - Seja responsável ao adotar um animal

Moraes Moreira - "Eu Sou o Carnaval"

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Mulheres, obrigado pela luta!

ODE AO ATEÍSMO, poema de Itárcio Ferreira



Quero excluir deus de todos os meus poemas.

Da bíblia ao corão, do Bagavadguitá ao Torá,
da infância e da idade da razão.

Quero excluir deus da cachaça, do cigarro
do suor, do trabalho e da rebelião.

Quero excluir deus de toda a minha pequena existência:
do meu câncer, do meu infarto e da minha depressão.

Não posso creditar a tal figura invisível
a minha dor ou a minha felicidade.

Tudo depende de mim?
Tudo depende do sistema em que vivo:
o cruel Leviatã.

Assim pensam o filósofo, o bêbado, o perdedor,
o ateu e o socialista
que existem dentro de minha inconsciência.


Visistem o blog do poeta: Itárcio Ferreira, poemas
                                


sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

Motivacional do dia

Motivacional do dia.

AO DENUNCIAR O GOLPE, RADUAN LAVA ALMA DO BRASIL


Discurso do escritor Raduan Nassar, autor de Lavoura Arcaica (1975), Um Copo de Cólera (1978) e Menina a Caminha (1994), ao receber o Prêmio Camões Literatura 2016, a cerimônia foi realizada hoje, dia 17/02/2017:

"Excelentíssimo Senhor Embaixador de Portugal, Dr. Jorge Cabral.

Senhor Dr. Roberto Freire, Ministro da Cultura do governo em exercício.

Senhora Helena Severo, Presidente da Fundação Biblioteca Nacional.

Professor Jorge Schwartz, Diretor do Museu Lasar Segall.

Saudações a todos os convidados.

Tive dificuldade para entender o Prêmio Camões, ainda que concedido pelo voto unânime do júri. De todo modo, uma honraria a um brasileiro ter sido contemplado no berço de nossa língua. 

Estive em Portugal em 1976, fascinado pelo país, resplandecente desde a Revolução dos Cravos no ano anterior. Além de amigos portugueses, fui sempre carinhosamente acolhido pela imprensa, escritores e meios acadêmicos lusitanos.

Portanto, Sr. Embaixador, muito obrigado a Portugal.

Infelizmente, nada é tão azul no nosso Brasil.

Vivemos tempos sombrios, muito sombrios: invasão na sede do Partido dos Trabalhadores em São Paulo; invasão na Escola Nacional Florestan Fernandes; invasão nas escolas de ensino médio em muitos estados; a prisão de Guilherme Boulos, membro da Coordenação do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto; violência contra a oposição democrática ao manifestar-se na rua. Episódios todos perpetrados por Alexandre de Moraes.

Com curriculum mais amplo de truculência, Moraes propiciou também, por omissão, as tragédias nos presídios de Manaus e Roraima. Prima inclusive por uma incontinência verbal assustadora, de um partidarismo exacerbado, há vídeo, atestando a virulência da sua fala. E é esta figura exótica a indicada agora para o Supremo Tribunal Federal.

Os fatos mencionados configuram por extensão todo um governo repressor: contra o trabalhador, contra aposentadorias criteriosas, contra universidades federais de ensino gratuito, contra a diplomacia ativa e altiva de Celso Amorim. Governo atrelado por sinal ao neoliberalismo com sua escandalosa concentração da riqueza, o que vem desgraçando os pobres do mundo inteiro.

Mesmo de exceção, o governo que está aí foi posto, e continua amparado pelo Ministério Público e, de resto, pelo Supremo Tribunal Federal.

Prova da sustentação do governo em exercício aconteceu há três dias, quando o ministro Celso de Mello, com suas intervenções enfadonhas, acolheu o pleito de Moreira Franco. Citado 34 vezes numa única delação, o ministro Celso de Mello garantiu, com foro privilegiado, a blindagem ao alcunhado “Angorá”. E acrescentou um elogio superlativo a um de seus pares, o ministro Gilmar Mendes, por ter barrado Lula para a Casa Civil, no governo Dilma. Dois pesos e duas medidas

É esse o Supremo que temos, ressalvadas poucas exceções. Coerente com seu passado à época do regime militar, o mesmo Supremo propiciou a reversão da nossa democracia: não impediu que Eduardo Cunha, então presidente da Câmara dos Deputados e réu na Corte, instaurasse o processo de impeachment de Dilma Rousseff. Íntegra, eleita pelo voto popular, Dilma foi afastada definitivamente no Senado.

O golpe estava consumado!

Não há como ficar calado.

Obrigado".

PALAVRAS, poema Sylvia


Golpes 
De machado na madeira,
E os ecos!
Ecos que partem
A galope.

A seiva
Jorra como pranto, como
Água lutando
Para repor seu espelho
Sobre a rocha

Que cai e rola,
Crânio branco
Comido pelas ervas.
Anos depois, na estrada,
Encontro

Essas palavras secas e sem rédeas,
Bater de cascos incansável.
Enquanto do fundo do poço, estrelas fixas
Decidem uma vida.

Sylvia Plath

Tradução de Ana Cristina César

Belchior - "Jornal blues" (Canção Leve de Escárnio e Maldizer)

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

AMEM


O valioso tempo dos maduros


Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do que já vivi até agora. Tenho muito mais passado do que futuro.

Sinto-me como aquele menino que ganhou uma bacia de jabuticabas. As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.

Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.

Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.

Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos.

Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário geral do coral. As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa…

Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana, que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade…

Só há que caminhar perto de coisas e pessoas de verdade. O essencial faz a vida valer a pena.

E para mim, basta o essencial!


Mário Pinto de Andrade

Acalanto, poema de Paulo Henriques Britto


Noite após noite, exaustos, lado a lado,
digerindo o dia, além das palavras
e aquém do sono, nos simplificamos,

despidos de projetos e passados,
fartos de voz e verticalidade,
contentes de ser só corpos na cama;

e o mais das vezes, antes do mergulho
na morte corriqueira e provisória
de uma dormida, nos satisfazemos

em constatar, com uma ponta de orgulho,
a cotidiana e mínima vitória:
mais uma noite a dois, um dia a menos.

E cada mundo apaga seus contornos
ao aconchego de um outro corpo morno.

Paulo Henriques Britto

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Para refletir (66)

Gore Vidal

"Se as resoluções saídas do Tribunal de Nuremberg fossem aplicadas, então todos os Presidentes norte-americanos pós-1945 teriam de ser enforcados. Com isto quero eu dizer que todos eles cometeram o mesmo tipo de crimes que aqueles que foram condenados à morte pelo Tribunal de Nuremberg."

(Gore Vidal, romancista, dramaturgo, ensaísta, roteirista e ativista político estadunidense)

O GATO DE KAFKA, poema de Itárcio Ferreira


Todas as sextas-feiras,
aos finaizinhos das tardes,
assomam em mim vibrantes explosões da alma.
Serão também explosões do corpo?

Um enxame de flores, sensações e insetos,
desembocam num rio que trago escondido no peito.
Apenas Emília,
amor maior da minha infância, teve acesso às suas águas.

Mas Emília,
branca como um anjo de uma asa só,
morreu...

Um dia, depois ler Kafka,
tomar uma limonada e sonhar:
transformou-se em pássaro.
Um pássaro mais lindo
que o amanhecer em Pontas de Pedra;
mais lindo que os sorrisos
de Claras, Rosas, Lourdes...
Inebriante pássaro, mais lindo que o próprio sorriso de Emília!

Mas uma noite, enquanto cantava,
um gato a devorou...
Meu Deus...
Apenas Emília e o mar faziam-me felizes.
Nessas horas, nesses instantes de lembranças, saudades e medos,
vibro-me, uma corda retesada, um epilético,
um quase morto.


Visitem o blog do poeta: Itárcio Ferreira, poemas


quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

MAIS DE 300 FILMES ALTERNATIVOS LEGENDADOS PARA ASSISTIR ONLINE



Filmoteca Online foi criada há quase três anos com o objetivo de facilitar o acesso a filmes que estão fora do circuito comercial.

“Sempre assisti muitos filmes e tenho um espírito um pouco arqueológico para o cinema, gosto de desenterrar coisas raras e pesquisar sobre filmes que caíram no esquecimento. “

Um catálogo riquíssimo e com uma curadoria primorosa, com filmes de mais de 40 países. Porém, para conseguir ver os filmes você precisa criar um perfil no VK, uma espécie de Facebook russo (é rápido e vale a pena pelo catálogo de filmes) ou consultar outras formas alternativas de assistir aqui.

As imagens do início do post são filme "Suspiria", do italiano Dario Argento. Um filme de terror com um visual que vai encanta qualquer fã do Wes Anderson.

Para explorar o catálogo, clique aqui. 

Miriam Makeba - "Pata Pata"