Aos Mestres, com carinho!

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Drummond, Vinícius, Bandeira, Quintana e Mendes Campos

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Estava eu na sala de espera de um consultório médico


Publicado originalmente em 25/08/09, no Claudicando.

Estava eu na sala de espera de um consultório médico e resolvi folhear aquelas revistas velhas que sempre encontramos nesses ambientes, eram umas dessas revistas semanais tipo Veja, Isto É, Época, nenhuma, claro, com a qualidade de uma Carta Capital ou Caros Amigos, mas para passar o tempo vale tudo. 

Comecei a ler uma entrevista com um famoso chefe de cozinha francês [1], não lembro o nome do distinto, apenas que o mesmo tinha fechado o seu famoso restaurante e passara a ser um apresentador de um programa de culinária [2] de grande audiência num dos canais de televisão da França. 


Perguntado sobre o seu mais famoso prato, o famoso chefe de cozinha francês disse ser, modestamente [3], um purê, isto mesmo, um purê feito de batatas inglesas, leite, manteiga e sal, desses que mamãe nos prepara com carinho e habilidade. Pessoas de várias partes do mundo, afortunados financeiramente, inclusive os afortunados brasileiros, aquela minoria de 1% que detém a maior fatia do bolo [4], vinham ao seu restaurante para provarem do seu purê entre outros pratos e vinhos, não saindo um almoço ou jantar no seu restaurante por menos de duzentos dólares por pessoa [5]. 


Fiquei pensando, no meu país o salário mínimo é de 50 dólares mensais ou 200 reais; metade da população do meu Estado [6] vive com até 2 dólares por dia, o equivalente a 8 reais [7]; ou seja, na linha da pobreza. Os que não atingem este “até”, percentual que agora não lembro, sobrevivem milagrosamente com menos de 1 dólar ou menos de 3,95 reais por dia, isto é [8], abaixo da linha da pobreza. Chegamos a conclusão de que esses brasileiros têm, quando muito, a possibilidade apenas de saciar a sua fome, nunca, é claro, com um purê preparado por um famoso chefe de cozinha francês. Os outros 1% da afortunada elite brasileira gastam, num único jantar, quatro salários mínimos por cabeça. 


Ou eu sou ingênuo, ou há algo de errado no nosso país e no mundo. A democracia apresenta sinais de senilidade, e não responde mais aos anseios da maioria, seu fundamento. Espanta-me que um presidente traía sistematicamente o seu povo e o seu país sem que nada seja feito, privatizando a preço de bananas pobres e com o nosso dinheiro, através do BNDES, o patrimônio nacional. 


Até breve! E que em 2003 possamos contar com Lula para reverter algo em favor do povo, de nós. 

[1] Há chefes famosos de outra nacionalidade?
[2] E poderia ser outra coisa, querido?
[3] Ou não?
[4] Nos EUA o 1% mais rico detém 34% do PIB, no Brasil está fatia é maior, pois a concentração de renda supera a norte-americana.
[5] Hoje uma bagatela de R$790,00 reais, graças à política neoliberal de FHC, privatizando o Brasil.
[6] Mais de 4 milhões de pessoas.
[7] O preço de dois chopes.
[8] Prefiro a Carta Capital.


Itárcio Ferreira
(Recife, 10 de outubro de 2002).