Aos Mestres, com carinho!

Aos Mestres, com carinho!
Drummond, Vinícius, Bandeira, Quintana e Mendes Campos

quarta-feira, 29 de maio de 2019

HÁ POETAS COM MUSA, poema de Sebastião Alba




Há poetas com musa. Muitos.
Eu, neste jardim do Éden,
a cargo do município,
onde um velho destece a sua vida
e, baixando o olhar,
ainda lhe afaga a trama,
quando a poesia se afoita,
amuo
na agrura de, ao acordar,
tê-la sonhado.

Sebastião Alba

Patricia Janekova: "Les oiseaux dans la charmille" (Jacques Offenbach - Les contes d' Hoffmann)

terça-feira, 28 de maio de 2019

A GELADEIRA, por Itárcio Ferreira




Com certeza, no Brasil, uma grande maioria da população, ao abrir a geladeira, só encontrará luz e água, pois, vivemos num país em que a desigualdade social é uma verdadeira guerra, um câncer.

Pensando nisso, amparado por uma situação financeira estável, - mais por sorte, por estar no lugar certo, do que por talento ou mérito, - resolvo dar uma olhada no interior da minha geladeira, já com cinco anos de uso e alguns pontos de ferrugem.

No pequeno compartimento que é o congelador encontro sorvete de açaí e cupuaçu, frutas típicas do Norte do país. O açaí, vermelho, chegou primeiro aqui em Recife, cidade onde moro, abrindo caminhos para o cupuaçu, de cor amarela-branca para bege, ambas já me ajudaram a curar algumas ressacas, sou grato.

Afora as frutas em forma de sorvete, caçambas de gelo para uísque ou coca cola para curar ressaca; embutidos, tipo presunto, salame – meu xodó – e mortadela, esta última mais por opção ideológica.

Logo abaixo do congelador, no corpo da geladeira, algumas marmitas com 300 gramas de comida cada, para o meu filho que gosta de malhar e quer virar o Hulk. Cada marmita contém arroz ou macarrão ou batata doce, acompanhados de carne de frango ou peixe. Como almoço no trabalho, raramente ataco uma das marmitas.

Um resto de pudim, um pedaço de melancia, uma guarnição de sopa completa o corpo da geladeira.

Logo abaixo, a bandeja de guardar verduras e frutas. Vejo: coentro, alho, alface, limão e um pedaço de gengibre para fazer um chazinho.

Da “auditoria” verifico que preciso comprar mais carne de frango e peixe; verifico que sou um privilegiado num país onde ainda existe fome, pobreza e miséria; verifico que o gelo já está no ponto para uma dose de uísque que esquentará o meu corpo e sedará a minha revolta que não consigo transformar em algo revolucionário.

Leci Brandão - "Zé Do Caroço"

segunda-feira, 27 de maio de 2019

As Bruxas de Salém

www.sympla.com.br

Teatro Barreto Júnior - (81) 3355-6398

Teatro Santa Isabel - (81) 3355-3323

O diabo tá certo


Serenata, poema de Cecília Meireles




Permita que eu feche os meus olhos,
pois é muito longe e tão tarde!
Pensei que era apenas demora,
e cantando pus-me a esperar-te.
Permita que agora emudeça:
que me conforme em ser sozinha.
Há uma doce luz no silêncio, e a dor é de origem divina.
Permita que eu volte o meu rosto para um céu maior que este mundo,
e aprenda a ser dócil no sonho como as estrelas no seu rumo.
Cecília Meireles

Soul de Brasileiro - "Zé do Caroço"


Composição de Leci Brandão.

domingo, 26 de maio de 2019

Ode 3.30, poema de Horácio


Erigi um monumento mais duradouro que o bronze, 
mais alto do que a régia construção das pirâmides 
que nem a voraz chuva, nem o impetuoso Áquilo 
nem a inumerável série dos anos,
nem a fuga do tempo poderão destruir.
Nem tudo de mim morrerá, de mim grande parte 
escapará a Libitina: jovem para sempre crescerei 
no louvor dos vindouros, enquanto o pontífice
com a tácita virgem subir ao Capitólio.
Dir-se-á de mim, onde o violento Áufido brama,
onde Dauno pobre em água sobre rústicos povos reinou, 
que de origem humilde me tornei poderoso,
o primeiro a trazer o canto eólio aos metros itálicos. 
Assume o orgulho que o mérito conquistou
e benévola cinge meus cabelos,
Melpómene, com o délfico louro.

Horácio

Figueroas - "Fofinha"

sábado, 25 de maio de 2019

Cordel: "Queremos Lula Livre porque Lula é Inocente", por Crispiniano Neto

Eterna Presença, poema de Mário de Andrade


Este feliz desejo de abraçar-te,
Pois que tão longe tu de mim estás,
Faz com que te imagine em toda a parte
Visão, trazendo-me ventura e paz.
Vejo-te em sonho, sonho de beijar-te;
Vejo-te sombra, vou correndo atrás;
Vejo-te nua, oh branco lírio de arte,
Corando-me a existência de rapaz…
E com ver-te e sonhar-te, esta lembrança
Geratriz, esta mágica saudade,
Dá-me a ilusão de que chegaste enfim;
Sinto alegrias de quem pede e alcança
E a enganadora força de, em verdade,
Ter-te, longe de mim, juntinho a mim.
Mário de Andrade

Ruy Maurity - "Nem Ouro Nem Prata"

quinta-feira, 23 de maio de 2019

Cada um tem o mito que merece


Os mensageiros, poema de Sylvia Plath



Palavra de lesma em prato de folha?
Não é minha. Não a aceite.
Ácido acético em lata selada?
Não o aceite. Não é genuíno.
Anel de ouro e nele o sol?
Mentiras. Mentiras e uma dor.
Geada numa folha, o imaculado
Caldeirão, estalando e falando
Sozinho no topo de cada um
Dos nove Alpes negros,
Um distúrbio nos espelhos,
O mar estilhaçando seu cinza –
Amor, amor, minha estação.
Sylvia Plath

ANDREA MOTIS, JOAN CHAMORRO QUINTET & SCOTT HAMILTON - "MEDITAÇÃO" (A. C. JOBIM)

terça-feira, 21 de maio de 2019

Chico Buarque ganha o Prêmio Camões 2019

                                                                                             Foto: Bel Pedrosa

Via DCM


O cantor, compositor e escritor brasileiro Chico Buarque ganhou o Prêmio Camões 2019. O anúncio foi realizado nesta terça-feira, 21, no Rio de Janeiro, após uma reunião na sede da Biblioteca Nacional.
Chico Buarque já havia vencido, em 2010, o Jabuti, principal prêmio literário brasileiro, pelo seu romance Leite Derramado, e em 2006, com Budapeste.
Embora sua carreira musical seja a mais proeminente, Chico já escreveu peças de teatro, como Roda VivaGota d’Água, Calabar e Ópera do Malandro, e livros como Estorvo, Benjamim, Budapeste, Leite Derramado O Irmão Alemão
O vencedor foi escolhido por uma equipe de seis jurados indicados pela Biblioteca Nacional do Brasil, pelo Ministério da Cultura de Portugal e pela comunidade africana. São eles os portugueses Clara Rowland e Manuel Frias Martins, os brasileiros Antonio Cicero Correia Lima e Antônio Carlos Hohlfeldt, a angolana Ana Paula Tavares e o moçambicano Nataniel Ngomane.
(…)

Mayra Andrade - "Prendre un enfant"

20 COISAS QUE QUERO FAZER ATÉ 2020, por Itárcio Ferreira


Meu primeiro desejo é estar vivo (1) em 2020, senão os outros desejos se tornariam inócuos, uma obviedade. Fosse está lista feita quando eu tinha meus vinte ou trinta anos, não seriam 20 coisas, mas, 40 coisas. Hoje, quase perto dos sessenta, meus desejos arrefeceram junto com a decadência física.

Ser ator (2) ou roqueiro (3) se tornam mais difíceis quando você não colocou em prática, desde a adolescência, o exercício das técnicas e dos talentos para tais artes. Claro que ainda tenho sonhos, hoje são pequenos, ontem eram imensos.

O desejo de viver numa sociedade mais justa (4), socialista, este nunca morreu, continua mais forte e firme do que nunca. Os desejos do ego é que foram diminuindo, sumindo. Conhecer Paris (5), morar numa casa a beira mar (6), criar um monte de cachorros (7), são coisas que vão ficando distante e depende de dinheiro que não tenho sobrando.

Espero que até 2020 meus filhos criem asas (8), pois, com a crise dois estão desempregados.

Em 2020 completo todos os requisitos para minha aposentadoria (9) o que quero muito, mas, com o desgoverno golpista, não tenho certeza se terei. Aposentado, posso me dedicar a ler mais (10), ir à praia com maior frequência (11), beber sem me preocupar com a ressaca (12), dedicar mais tempo aos meus poemas (13) e, quem sabe, a prosa (14).

Não quero viver muito se para isso não puder continuar a me cuidar sozinho (15), bem sei que nenhum poder tenho sobre essa situação, mas, é um grande desejo. Já falei para os meus filhos que sou doador de órgãos e que quero ser cremado.

No mais um mundo sem fome (16) ou guerra (17); um mundo livre do capitalismo (18), o que é sonhar muito, mas, nos sonhos não devemos impor limites.

Quero ver Sérgio Moro preso até lá (19), isto é, se a CIA permitir, por seus desmandos e destruição da nossa economia.

Por fim, conhecer Cuba (20) de onde sopra um cheiro de rum e de liberdade.

Recife, 2016.

segunda-feira, 20 de maio de 2019

Sammy Davis Jr. - "Ol' Man River"

O poeta da roça, poema de Patativa do Assaré



Sou fio das mata, cantô da mão grossa,
Trabáio na roça, de inverno e de estio.
A minha chupana é tapada de barro,
Só fumo cigarro de páia de mío.

Sou poeta das brenha, não faço o papé
De argum menestré, ou errante cantô
Que veve vagando, com sua viola,
Cantando, pachola, à percura de amô.

Não tenho sabença, pois nunca estudei,
Apenas eu sei o meu nome assiná.
Meu pai, coitadinho! vivia sem cobre,
E o fio do pobre não pode estudá.

Meu verso rastêro, singelo e sem graça,
Não entra na praça, no rico salão,
Meu verso só entra no campo e na roça
Nas pobre paioça, da serra ao sertão.

Só canto o buliço da vida apertada,
Da lida pesada, das roça e dos eito.
E às vez, recordando a feliz mocidade,
Canto uma sodade que mora em meu peito.

Eu canto o cabôco com suas caçada,
Nas noite assombrada que tudo apavora,
Por dentro da mata, com tanta corage
Topando as visage chamada caipora.

Eu canto o vaquêro vestido de côro,
Brigando com o tôro no mato fechado,
Que pega na ponta do brabo novio,
Ganhando lugio do dono do gado.

Eu canto o mendigo de sujo farrapo,
Coberto de trapo e mochila na mão,
Que chora pedindo o socorro dos home,
E tomba de fome, sem casa e sem pão.

E assim, sem cobiça dos cofre luzente,
Eu vivo contente e feliz com a sorte,
Morando no campo, sem vê a cidade,
Cantando as verdade das coisa do Norte.

Patativa do Assaré

sábado, 18 de maio de 2019

Rita Payés & Elisabeth Roma - "A Rita"

Poema do homem, poema de Solano trindade


Desci à praia 
Para ver o homem do mar, 
E vi que o homem 
É maior que o mar 

Subi ao monte 

Pra ver o homem da terra, 
E vi que o homem 
É maior que a terra 

Olhei para cima 

Para ver o homem do céu, 
E vi que o homem 
É maior que o céu.

Solano Trindade

quinta-feira, 16 de maio de 2019

Figueroas - "Lambada Para Bangladesh"

ode 1.11 (“Carpe diem”), poema de Horácio



Não interrogues, não é lícito saber a mim ou a ti
que fim os deuses darão, Leucônoe. Nem tentes
os cálculos babilônicos. Antes aceitar o que for,
quer muitos invernos nos conceda Júpiter, quer este último
apenas, que ora despedaça o mar Tirreno contra as pedras
vulcânicas. Sábia, decanta os vinhos, e para um breve espaço de tempo
poda a esperança longa. Enquanto conversamos terá fugido despeitada
a hora: colhe o dia, minimamente crédula no porvir.

Horácio

terça-feira, 14 de maio de 2019

De Ennio Morricone - "The Good, The Bad and The Ugly"

O SÉTIMO LIVRO, poema de Itárcio Ferreira


Mares, encouraçados, corpos,
Peixes, histórias de mar alto e infinitudes.

Durante sete dias o terá em suas mãos
Sete são as cores do arco-íris

Sete são as voltas e as idas
E assim o ciclo será completado e repetido
Mesmo abrindo as portas dos infernos.

Qual casas que se multiplicam em filhos
Cabeças de hidra que cantam pelo pão.
Uivos!

Escolha bem os Livro e o Sétimo se multiplicarão
Eternamente em cada letra, palavras, parágrafo,
Afagos e falos nervosos sem direção.

O demônio será seu guardião
Não o enganarás mais do que sete vezes sete
O aprisionas e terás vinhos em abundância
E deliciosas dores de cabeça.

Itárcio Ferreira

domingo, 12 de maio de 2019

Mayra Andrade - "Manga"

As Andorinhas, poema de Mauro Mota



Torre feita de canto e de plumas 
ou feitas de argamassa as andorinhas? 
A simbiose do pouso nos litúrgicos 
beirais e a migração de alvenaria. 
Era a torre da igreja ornitológica, 
onde a cor da manhã se suspendia. 
Era uma ave de bronze na gaiola, 
era a língua do sino presa à corda. 

Mas quando, no intervalo dessa pena, 
no seu repique matinal batia, 
era a coletivíssima revoada: 

asas de cal e músicas de penas 
caindo todas pelo chão da praça 
como se a torre se despedaçasse.


Mauro Mota

sábado, 11 de maio de 2019

Sammy Davis Jr. - "One For My Baby"

A um Estranho, poema de Walt Whitman


Estranho que passa! você não sabe com quanta saudade eu lhe olho,
Você deve ser aquele a quem procuro, ou aquela a quem procuro, (isso me vem, como em um sonho,)
Vivi com certeza uma vida alegre com você em algum lugar,
Tudo é relembrado neste relance, fluído, afeiçoado, casto, maduro,
Você cresceu comigo, foi um menino comigo, ou uma menina comigo,
Eu comi com você e dormi com você – seu corpo se tornou não apenas seu, nem deixou o meu corpo somente meu,
Você me deu o prazer de seus olhos, rosto, carne, enquanto passamos – você tomou de minha barba, peito, mãos, em retorno,
Eu não devo falar com você – devo pensar em você quando sentar-me sozinho, ou acordar sozinho à noite,
Eu devo esperar – não duvido que lhe reencontrarei,
Eu devo garantir que não irei lhe perder.

Walt Whitman

quarta-feira, 8 de maio de 2019

The Danish National Symphony Orchestra - "A Fistful of Dollars"

Canção para ‘Paulo’, poema de Alex Polari



              A Stuart Angel
Eles costuraram tua boca
com o silêncio
e trespassaram teu corpo
com uma corrente.
Eles te arrastaram em um carro
e te encheram de gases,
eles cobriram teus gritos
com chacotas.
Um vento gelado soprava lá fora
e os gemidos tinham a cadência
dos passos dos sentinelas no pátio.
Nele, os sentimentos não tinham eco
nele, as baionetas eram de aço
nele, os sentimentos e as baionetas
se calaram.
Um sentido totalmente diferente de existir
se descobre ali,
naquela sala.
Um sentido totalmente diferente de morrer
se morre ali,
naquela vala.
Eles queimaram nossa carne com os fios
e ligaram nosso destino à mesma eletricidade.
Igualmente vimos nossos rostos invertidos
e eu testemunhei quando levaram teu corpo
envolto em um tapete.
Então houve o percurso sem volta
houve a chuva que não molhou
a noite que não era escura
o tempo que não era tempo
o amor que não era mais amor
a coisa que não era mais coisa nenhuma.
Entregue a perplexidades como estas,
meus cabelos foram se embranquecendo
e os dias foram se passando.
Alex Polari