Aos Mestres, com carinho!

Aos Mestres, com carinho!
Drummond, Vinícius, Bandeira, Quintana e Mendes Campos

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

ALTO DA SÉ

(Alto da Sé - Olinda - PE)



Luzes.

Do Alto da Sé, as luzes.

Da cidade, as luzes.

Por meus olhos vistas, luzes.

Pelos muitos olhos da cidade,
visto.

Do alto dos olhos da cidade,
a Sé vista.

Os olhos a cidade vendo.
Vendo a Sé, os olhos,
nas luzes da cidade,
no olhar da Sé,
entre luzes o olhar:
ar(te).


(Itárcio Ferreira)

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

AOS DEZ ANOS DE IDADE


"Mas havia o sol da manhã e o rum
que eu sabia vinha de Cuba
junto com uma grande dose de igualdade."



Aos dez anos de idade,
o meu mundo ainda era azul,
apesar da poliomielite que aos poucos
enegrecia meu coração,
transformando minhas pernas em fardos
e em poesia as de Garrincha.

Baleias, também azuis,
navegavam na minha imaginação
e nos mares de Pontas de Pedra e Gaibu.

Pensamentos, palavras, mulheres nuas
e o frevo me esquentavam a alma
junto com marchinhas de carnaval.

E as colchas de retalhos de Vó Lídia
esquentavam minhas pernas
nas noites frias de minha vida.

Mas havia o sol da manhã e o rum
que eu sabia vinha de Cuba
junto com uma grande dose de igualdade.

E tudo enchia os meus olhos e a minha vidinha:
mulheres de verdade desfilavam de biquínis
e elas enchiam meus olhos
e me torturavam de desejos.

Era doce a vida, era doce o mar,
ainda não havia a desilusão do amor,
da amizade e da política.


(Itárcio Ferreira)

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

ONANISMO

(A morte de Onã, de Franc Lanjšček)


Por que sentimos
às vezes
que o amor mais completo
é quando somos
amante e amado,
sujeito e objeto?

Será por que nos conhecemos
tão certo?

Ou por que nos falta
escolha,
afeto?


(Itárcio Ferreira)

terça-feira, 5 de outubro de 2010

AVENTURA

(Jack Vettriano)



O corpo nu da amada
repousa,
a cabeça numa almofada.

Uma das mãos inerte
no chão,
a outra cobre o ventre.

Os seios pequenos
- mamilos róseos -
me sorriem.

Mergulho em ti
como quem mergulha no mar,
alto mar!

E o pior,
em toda minha vida
nunca aprendi
a nadar.


(Itárcio Ferreira)

terça-feira, 28 de setembro de 2010

RITUAL





Preparar a cama
como o último dos prazeres.

O corpo preparar como
um instrumento de música
ou de arar.

A amada
como o campo a ser lavrado
ou o cordeiro para o sacrifício.

Que os deuses afinal
nos abençoem.


(Itárcio Ferreira)

terça-feira, 21 de setembro de 2010

ONDE VAGAM OS ESPÍRITOS DE WALT WHITMAN E POE?




Onde vagam os espíritos de Walt Whitman e Poe?



Aqui, nesta solidão monótona do existir?



Onde a bala que matou Maiakóvski?



Onde Baco?



Libertação?



Não tenho mais esperança nem dinheiro para o último gole.



Onde o espírito de Pessoa?



Onde Fernando bebeu seu último copo de vinho?



Onde a bala que matou Maiakóvski?



Onde morri?


(Itárcio Ferreira)

terça-feira, 31 de agosto de 2010

CANTIGA PARA QUEM PARTE


"A morte
exige trabalho, trabalho lento
como quem nasce."
(Affonso Romano de Sant'Anna)


                      

                                À memória de Itaney e de Vó Lídia




A morte é clara e límpida

como água,

tão certa como... a morte.



No entanto, quando nos dizem

morreu!,

achamos impossível,

tão cedo! Tão rápido!

Tão feroz!



E nem percebemos como

as suas afiadas garras

dilaceram nosso coração,

nosso espírito.




Quando vemos, morremos também

um pouco.



Mas a vida segue

indiferente aos nossos protestos,

como se nada houvesse acontecido,

como os humildes

que sempre esbarram

em interesse dos poderosos.



E queremos gritar e dizer:

Morreu! Você não sente?



Mas nos reconfortamos nas lágrimas

e nas lembranças,

pois a morte é natural,

mas como custa a acostumar!


(Itárcio Ferreira)