Por Flávio Aguiar, via Carta Maior
Em 2009 a
protest-folksong dos Estados Unidos perderam uma de suas musas mais famosas e
queridas: a Mary (Travers) do conjunto Peter, Paul and Mary. Agora, nesta
segunda-feira, 26, perdeu seu gênio criador, Pete Seeger, aos 94 anos.
Se você se encanta com Bob Dylan, Joan Baez, Harry Belafonte, Bruce Springsteen, com PP&M, agora reduzidos a Peter (Yarrow) e (Noel) Paul (Stookey), com o canadense Leonard Cohen, a sulafricana Miriam Makeba, até mesmo com as canções brasileiras de protesto durante a ditadura militar, e ainda de quebra Moustaki na França, Pablo Milanes e Silvio Rodrigues em Cuba, Daniel Viglietti no Uruguai, Victor Jara e Violeta Parra no Chile, José Afonso e Francisco Fanhais em Portugal, e ainda muito mais, saiba, se ainda não sabia, que por trás de tudo isto está o indelével e imorredouro gênio criador de Pete Seeger.
É difícil dizer, na obra de Pete Seeger, o que é criação dele, o que é adaptação de pesquisas feitas no populário musical e poético dos Estados Unidos, o que é parceria, o que é que ele simplesmente tomou emprestado. Alguns nomes famosos, na sua interpretação ou mais ainda, na outros intérpretes: Goodnight, Irene; If I had a Hammer; We shall overcome, que se tornou praticamente o hino do movimento pelos direitos civis e antirracistas dos anos 60; e a imortal Where have all the Flowers gone, letra e música interpretadas por Marlene Dietrich, na versão alemã, em Israel – primeira vez que alguém cantou em alemão, em público, naquele estado, e que veio a ser um hino internacional dos movimentos pacifistas internacionais.
Não houve movimento de esquerda, desde os anos 30, nos Estados Unidos, de que Pete Seeger não tenha participado: as lutas de trabalhadores nos anos 30 e 40; os movimentos pacifistas e antifascistas na mesma época; o antimacartismo; os movimentos pelos direitos civis, direitos dos negros, contra a guerra do Vietnã, contra as intervenções militares dos Estados Unidos no mundo inteiro; e por aí afora. Ainda cantou – com Bruce Springsteen, e embora com a voz já enfraquecida – na primeira posse de Barack Obama.
Na década de 40 Pete Seeger filiou-se ao Partido Comunista, que deixaria algum tempo depois. Mas isto valeu-lhe uma perseguição implacável pelo macartismo dominante na década de 50, e um prolongado ostracismo na mídia norte-americana, que queria condená-lo a um silêncio obsequioso, ao qual ele jamais se rendeu. Embora ausente dos grandes meios de divulgação, continuou a construir um prestígio inabalável, correndo o país e o mundo em audições sempre concorridas, e perseguidas por grupos de extrema-direta, como a John Birch Society. Ele nunca se importou: dizia que as manifestações contra suas apresentações só aumentavam-lhes o público.
Tampouco se importou quando, nos anos 50, foi condenado a um ano de prisão por desacato ao Congresso norte-americano. Chamado a depor no Comitê de Atividades Anti-Americana da Câmara de Deputados (que não era a presidida pelo senador Joe McCarthy, mas tinha o mesmo espírito desta), recusou-se a responder todas as perguntas. No lugar, propôs cantar as músicas de que ele era “acusado” de ter composto ou divulgado junto com o conjunto de que fazia parte, The Weavers, o que foi recusado. Depois de um longo processo, Seeger foi condenado em 1961, mas a sentença foi anulada no ano seguinte.
Seeger aborrecia a guitarra elétrica. Há uma anedota sobre isto, em que se diz que ele considerou uma apresentação de Bob Dylan com o instrumento uma “traição”, e que ele teria tentado cortar o cabo da guitarra com um machado. Testemunhas oculares garantem que ele não chegou a este extremo, embora tenha ficado “decepcionado” com Dylan, na ocasião.
As perseguições políticas e o ostracismo pela mídia sufocaram as atividades dos Weavers, e Seeger passou praticamente o resto da vida em atuações individuais, embora em shows com outros intérpretes e compositores. Tive a graça de vê-lo numa destas apresentações, num estádio superlotado em Boston, junto com Joan Baez, em 1968, já com os cabelos completamente brancos e uma calva algo pronunciada. Nas suas performances ele sempre incentivava o público a cantar junto – o que lhe permitiu fazer apresentações até pouco tempo atrás, já na casa dos 90 anos. Ali onde a sua voz falhava, o público complementava.
Seeger ganhou o prêmio Grammy em 1993; recebeu a Medalha Nacional do Mérito Artístico das mãos do presidente Bill Clinton, e a Medalha da Ordem de Félix Varela, a mais importante condecoração artística dada pelo governo cubano, em 1999.
Nos últimos anos engajou-se em lutas pelo meio ambiente, sobretudo no rio Hudson, no estado de Nova York, onde morava.
Incansável, nunca se deixou levar pelo estrelismo, coisa que, aliás, detestava. Apesar de ter rompido com o Partido, continuava dizendo-se “um comunista, mas com c minúsculo”. Talvez por isto mesmo, um autêntico Comunista com C maiúsculo.
Confira:
Where have all the flowers gone
Guantanamera
If I had a Hammer – 1956
Falando sobre We Shall Overcome
This Land is your Land
E muito mais…
******
Postagem programada - blogueiro de férias - 06/03 a 04/04/14.
Se você se encanta com Bob Dylan, Joan Baez, Harry Belafonte, Bruce Springsteen, com PP&M, agora reduzidos a Peter (Yarrow) e (Noel) Paul (Stookey), com o canadense Leonard Cohen, a sulafricana Miriam Makeba, até mesmo com as canções brasileiras de protesto durante a ditadura militar, e ainda de quebra Moustaki na França, Pablo Milanes e Silvio Rodrigues em Cuba, Daniel Viglietti no Uruguai, Victor Jara e Violeta Parra no Chile, José Afonso e Francisco Fanhais em Portugal, e ainda muito mais, saiba, se ainda não sabia, que por trás de tudo isto está o indelével e imorredouro gênio criador de Pete Seeger.
É difícil dizer, na obra de Pete Seeger, o que é criação dele, o que é adaptação de pesquisas feitas no populário musical e poético dos Estados Unidos, o que é parceria, o que é que ele simplesmente tomou emprestado. Alguns nomes famosos, na sua interpretação ou mais ainda, na outros intérpretes: Goodnight, Irene; If I had a Hammer; We shall overcome, que se tornou praticamente o hino do movimento pelos direitos civis e antirracistas dos anos 60; e a imortal Where have all the Flowers gone, letra e música interpretadas por Marlene Dietrich, na versão alemã, em Israel – primeira vez que alguém cantou em alemão, em público, naquele estado, e que veio a ser um hino internacional dos movimentos pacifistas internacionais.
Não houve movimento de esquerda, desde os anos 30, nos Estados Unidos, de que Pete Seeger não tenha participado: as lutas de trabalhadores nos anos 30 e 40; os movimentos pacifistas e antifascistas na mesma época; o antimacartismo; os movimentos pelos direitos civis, direitos dos negros, contra a guerra do Vietnã, contra as intervenções militares dos Estados Unidos no mundo inteiro; e por aí afora. Ainda cantou – com Bruce Springsteen, e embora com a voz já enfraquecida – na primeira posse de Barack Obama.
Na década de 40 Pete Seeger filiou-se ao Partido Comunista, que deixaria algum tempo depois. Mas isto valeu-lhe uma perseguição implacável pelo macartismo dominante na década de 50, e um prolongado ostracismo na mídia norte-americana, que queria condená-lo a um silêncio obsequioso, ao qual ele jamais se rendeu. Embora ausente dos grandes meios de divulgação, continuou a construir um prestígio inabalável, correndo o país e o mundo em audições sempre concorridas, e perseguidas por grupos de extrema-direta, como a John Birch Society. Ele nunca se importou: dizia que as manifestações contra suas apresentações só aumentavam-lhes o público.
Tampouco se importou quando, nos anos 50, foi condenado a um ano de prisão por desacato ao Congresso norte-americano. Chamado a depor no Comitê de Atividades Anti-Americana da Câmara de Deputados (que não era a presidida pelo senador Joe McCarthy, mas tinha o mesmo espírito desta), recusou-se a responder todas as perguntas. No lugar, propôs cantar as músicas de que ele era “acusado” de ter composto ou divulgado junto com o conjunto de que fazia parte, The Weavers, o que foi recusado. Depois de um longo processo, Seeger foi condenado em 1961, mas a sentença foi anulada no ano seguinte.
Seeger aborrecia a guitarra elétrica. Há uma anedota sobre isto, em que se diz que ele considerou uma apresentação de Bob Dylan com o instrumento uma “traição”, e que ele teria tentado cortar o cabo da guitarra com um machado. Testemunhas oculares garantem que ele não chegou a este extremo, embora tenha ficado “decepcionado” com Dylan, na ocasião.
As perseguições políticas e o ostracismo pela mídia sufocaram as atividades dos Weavers, e Seeger passou praticamente o resto da vida em atuações individuais, embora em shows com outros intérpretes e compositores. Tive a graça de vê-lo numa destas apresentações, num estádio superlotado em Boston, junto com Joan Baez, em 1968, já com os cabelos completamente brancos e uma calva algo pronunciada. Nas suas performances ele sempre incentivava o público a cantar junto – o que lhe permitiu fazer apresentações até pouco tempo atrás, já na casa dos 90 anos. Ali onde a sua voz falhava, o público complementava.
Seeger ganhou o prêmio Grammy em 1993; recebeu a Medalha Nacional do Mérito Artístico das mãos do presidente Bill Clinton, e a Medalha da Ordem de Félix Varela, a mais importante condecoração artística dada pelo governo cubano, em 1999.
Nos últimos anos engajou-se em lutas pelo meio ambiente, sobretudo no rio Hudson, no estado de Nova York, onde morava.
Incansável, nunca se deixou levar pelo estrelismo, coisa que, aliás, detestava. Apesar de ter rompido com o Partido, continuava dizendo-se “um comunista, mas com c minúsculo”. Talvez por isto mesmo, um autêntico Comunista com C maiúsculo.
Confira:
Where have all the flowers gone
Guantanamera
If I had a Hammer – 1956
Falando sobre We Shall Overcome
This Land is your Land
E muito mais…
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Postagem programada - blogueiro de férias - 06/03 a 04/04/14.
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