Vendam logo esta casa,
ela está cheia de fantasmas.
Na livraria, há um avô
que faz cartões de boas-festas com corações de purpurina.
Na tipografia, um tio
que imprime avisos fúnebres e programas de circo.
Na sala de visitas, um
pai que lê romances policiais até o fim dos tempos.
No quarto, uma mãe que
está sempre parindo a última filha.
Na sala de jantar, uma
tia que lustra cuidadosamente o seu próprio caixão.
Na copa, uma prima que
passa a ferro todas as mortalhas da família.
Na cozinha, uma avó
que conta noite e dia histórias do outro mundo.
No quintal, um preto
velho que morreu na Guerra do Paraguai rachando lenha.
E no telhado um menino
medroso que espia todos eles;
só que está vivo:
trouxe-o até ali o pássaro dos sonhos.
Deixem o menino
dormir, mas vendam a casa, vendam-na depressa.
Antes que ele acorde e
se descubra também morto.