O
preço do feijão
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão
O
funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras
-
porque o poema, senhores,
está fechado:
“não há vagas”
Só
cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
O
poema, senhores,
não fede
nem cheira
não fede
nem cheira
Ferreira Gullar
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