Conheça, nesta entrevista
concedida a Carlos Hortmann, para o 247, uma família que na sua intimidade tem
por hábito fazer paródias musicais por "tudo e por nada", que tem
como forma de vida o deboche e a ironia e que ficou conhecida nas redes sociais
recentemente com a marchinha de carnaval "Talquey Talquey A culpa é
do PT".
Por Carlos Hortmann, especial para o 247
Uma família que na sua intimidade tem por
hábito fazer paródias musicais por "tudo e por nada", que tem como
forma de vida o deboche e a ironia. Todavia, ao publicarem um vídeo numa rede
social, a "Família Passos" ganhou uma notoriedade retumbante com a
marchinha de carnaval "Talquey Talquey A culpa é do PT", mas não
parou por aí, depois vieram outras melodias e letras debochadas que colaram no
ouvido de muitos brasileiros, como: "Marchinha lava-jato, morô?!",
"Marchinha do 'Reaça' pobre de direita" entres outros
sucessos das redes. Por meio da música e letras afiadas eles conseguem fazer
sínteses políticas que nenhum politólogo conseguiu: "cuidado capitão com a
bota do Mourão", ou "O rapaz do lava-jato me enganou só lavou o lado
esquerdo do meu carro".
Essa
família criativa e musical, que reside na "república de Curitiba",
concedeu uma entrevista exclusiva ao Brasil 247. Dessa forma, os nossos leitores
poderão conhecer um pouco mais da matriarca Marília, do pai Nilson Reni e das
filhas Isis e Lígia Passos.
247 - A
família toda trabalha profissionalmente com música?
Isis:
sou funcionária pública, porém desde pequena desfrutei de atividades artísticas
em casa, visto que a minha mãe é professora de música e a minha irmã é
violinista. Mas também participei em eventos musicais de MPB em Curitiba.
Lígia:
sou violinista e professora num projeto social. Trabalhamos com crianças
financeiramente e psicologicamente vulneráveis, e a partir dessa realidade
podemos constatar cotidianamente o quanto a arte é transformadora na vida
dessas crianças (voz emocionada).
Marília:
sou professora de português e música, só que agora aposentada. Também fui
regente de coros infantis e de empresas. Atuo como compositora e arranjadora,
tanto que no ano de 2008 fui finalista num concurso de Marchinhas de Carnaval
do Rio de Janeiro: "O ET de Copacabana".
Nilson
Reni: trabalhei como metalúrgico desde 1977 até me aposentar, mas também atuei
uma época como músico na noite e em bandas de carnaval. A nossa família uma
época montou um grupo de Música Popular Brasileira (MPB) aqui em Curitiba.
247 – A vossa
família tem um histórico de militância política?
Família
Passos: grande parte da família nunca teve uma atividade político partidária,
mas sempre estivemos comprometidos com os valores progressistas e pelo fim da
desigualdade social. Por outras palavras, não somos ligados a nenhum partido.
Nilson
Reni: eu particularmente desde muito cedo lutei contra a ditadura militar
brasileira, ainda no Rio Grande do Sul. Hoje trabalho no Sindicato dos
Metalúrgicos da Grande Curitiba, já fiz muitas assembleias em porta de fábrica.
247 – Quando
surgiu a ideia de fazerem as marchinhas com temáticas políticas?
FP:
começamos a brincar em família quando começou o período eleitoral. Como
dissemos anteriormente, a ironia faz parte do nosso modo de ser em família.
Tiramos sarro de tudo. Mas ocorreram várias situações que nos puseram a pensar
sobre a atual conjuntura, principalmente esses movimentos reacionários de
extrema-direita com um discurso anti-cultura em geral: "artista é tudo
vagabundo". O exemplo mais impactante desse movimento anti-artista foi os
ataques e agressões que o Chico Buarque sofreu, artista de uma importância
ímpar na nossa cultura recente. E esses movimentos reacionários foram se
alastrando para muitos campos, como a literatura, as artes plásticas e até a
educação. Pois estão a tentar criminalizar até uma figura como Paulo Freire, o
pensador brasileiro mais lido em universidades estrangeiras. À volta de todo
esse contexto é que começamos a tratar de política em nossos convívios
familiares, por meio da música e do deboche.
247 – Como
reagiram ao perceber que da noite para o dia o vosso vídeo ("Talquey
Talquey A culpa é do PT") viralizou na internet?
FP:
foi inesperado! Era mais uma brincadeira de família, pois foi uma música que
compusemos em meia hora e achamos que ficou "legal", então decidimos
colocar no Facebook para os nossos amigos se divertirem também. Muitos desses
amigos começaram a partilhar em grupos e em pouco tempo percebemos que o vídeo
estava a viralizar. Acreditamos que o aumento de visualizações se deu quando o
youtuber, Felipe Neto, divulgou o nosso vídeo nas suas páginas de rede social.
Realmente nós não estávamos preparados para tanta repercussão.
247– Vocês
tinham a noção de que iriam conseguir furar a bolha da polarização política
vigente no Brasil?
FP:
Isso foi algo que não premeditamos. Mas realmente ficamos um pouco espantados
pelo fato de muitas pessoas que se dizem de direita partilharem as nossas
marchinhas, principalmente o primeiro vídeo. Muitas dessas pessoas não
perceberam a ironia que estava por detrás de cada frase, por exemplo, "o
bozo é mito", ou que nós mesmos estávamos nos chamar de "corja
vagabunda de artista" como uma forma de debochar o próprio Bolsonaro.
Gostaríamos
de ressaltar que quem nos fornece todas essas ideias de ironia e gozação são a
própria turma do Bolsonaro. Vejamos por exemplo, "Jesus na goiabeira",
"Mamadeira de piroca" e entre muitas outras. Não é difícil de
criarmos porque está tudo tão pronto que só nos resta encaixar os textos nas
rimas e depois colocarmos a música. Mas é evidente que gostamos de colocar uma
pitada de acidez nas letras: "mamãe eu vou comprar uma arma". Risos!
247 – Vocês
têm a consciência de que estavam a fazer um trabalho de politização?
FP:
nós sabíamos que ao ironizarmos algumas situações políticas recentes, estávamos
a cutucar no atual governo. Nós não nos identificamos com esse governo
reacionário, com um presidente que propaga o ódio e a violência como forma de
vida. Um governo que olha para os artistas como seus inimigos.
Muitos
blocos de carnaval de todo o Brasil, que têm um histórico com pensamento da
esquerda ou de resistência nos contactaram a fim de pedir as músicas para serem
tocas no carnaval. Nesse sentido podem ser utilizadas como forma de politizar a
nossa atual situação política.
Acesse aqui a página
da família no Facebook e confira alguns vídeos da Família Passos.