A pior coisa que existe,
Num mundo criado por um
deus guerreiro
E humanos sanguinários,
Poderia ser a dor física, apenas,
A flecha penetrando a
carne viva,
Que sangra, uiva e grita.
A fome seria outra
possibilidade,
Pois é inexprimível o
suplicio do faminto;
Do sedento: da sede de
água, de justiça,
De igualdade, da sede do
socialismo.
A pior dor que o deus
guerreiro
Dos cristãos legou ao
mundo,
Tinha que ser uma dor
suprema,
Indivisível, inimaginável,
única, nunca sentida.
Por ser provocada pelo
símbolo do amor,
Da carência, da vaidade,
das iniquidades,
Uma dor que não consta dos
livros sagrados,
Dos túmulos caiados, uma
dor: A Dor.
Qual ser, qual programa,
qual matriz,
Qual irrealidade
Conspira para que nossos
cérebros
Sejam inimigos de o nosso
existir?
Nada, nada, nada, nenhum
bálsamo,
Nenhum
médico, nenhum alquimista
Nem feiticeiro,
Descobrirão a essência da maldade
De este ser tão
pusilânime.
A maior dor que um
Pode cravar sobre outro
ser,
Além de uma estaca no
peito,
É a consciência do existir:
Sofro, logo existo;
Desejo, logo sofro.
Nada é sonho,
Nada é pesadelo
Do qual podemos acordar
E sorrir: era tudo
brincadeira!
Nada é mais vil e mais
cômico,
Mais devastador do que a
velhice,
Seus enxaques, suas dores,
o ridículo.
A velhice e a sua
impossibilidade
De ser, de amar, de decidir
O que não lhe é,
sadicamente, permitido.
(Itárcio Ferreira)
(Itárcio Ferreira)
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