Por
Dário Neto
Via
Jornal GGN
Eu
entendo e me solidarizo às manas indignadas com o fato de Conceição
Evaristo não ter sido eleita para a ABL. Contudo, toda vez que penso
nesse museu, me lembro de Antonio Candido por dois motivos: primeiro,
ele não compôs essa trupe. Enquanto Antonio Candido é presente
como um grande pensador, analista e crítico do Brasil, a ABL é
passado e depende exclusivamente da glória alheia - sobretudo a de
Machado de Assis; segundo, em "Literatura e Subdesenvolvimento",
Candido identifica esse movimento de fundar uma Academia aos moldes
dos países europeus uma prática colonialista que até hoje
vergonhosamente assassina a população negra e indígena no Brasil.
Com
isso, Candido nos lembra que se tornar imortal nada tem que ver com
esse colonialismo. Se o grande mestre Antonio Candido não coube na
ABL para vergonha dela mesma, quanto mais Conceição Evaristo, muito
maior que o mestre, pois tendo, semelhante a ele, a argúcia de ler o
mundo, o supera por conseguir transformar esta capacidade analítica
em poesia. Certamente Evaristo é muito grande para a ABL.
Os
Acadêmicos tentaram várias vezes convencer Candido a se candidatar
e ele sempre rejeitou gentilmente. Quando o mestre e amigo de
Candido, Fernando Azevedo faleceu, o acadêmico Chico Barbosa
procurou-o durante o velório para convencê-lo a disputar a cadeira
vaga pela morte de seu mestre, o crítico alegou que não tinha
espírito associativo. Em 1993, a ABL homenageou Candido com o Prêmio
Machado de Assis, evidenciando a intenção de seduzi-lo a compor o
grupo e novamente, ele rejeitou. A grandeza que buscavam para si com
a associação deste grande crítico literário, certamente
alcançariam com Evaristo. E por que não foram atrás dela ao invés
de esperar que ela manifestasse interesse? E por que a rejeitaram
quando poderiam ter laureado a coroa enferrujada dessa Associação?
Pelo simples motivo de ela ser mulher e negra. Assim como aconteceu a
Conceição Evaristo, também essa gente que há séculos se acham
donas da Literatura Brasileira rejeitou a primeira romancista Maria
Firmina de Menezes, a primeira poeta modernista negra Gilka Machado,
rejeitaram Carolina de Jesus e tantas que ainda estamos descobrindo.
Isso só mostra o quanto esta Academia é pequena, muito pequena.
Dário
Neto é
Doutor em Literatura Brasileira pela USP com a tese "A pena do
cronista: a presença das crônicas nos romances machadianos",
Professor Colaborador em Teoria Literária na UNESPAR e autor do
livro de contos Candelabro.