"Não tem porque interpretar um poema. O poema já é uma interpretação." (Mário Quintana)
Aos Mestres, com carinho!

Drummond, Vinícius, Bandeira, Quintana e Mendes Campos
quarta-feira, 31 de maio de 2017
Laboratório de Sensibilidade, poema de Jomard Muniz de Britto
Entre o fruto e o dente
qual o lugar do inconsciente?
Mais vale uma banana no inciso
que duas maçãs no paraíso.
Entre o prazer e o dever
como o libido satisfazer?
Mais vale uma fruta na mão
que três desejos em não.
Entre memória e esquecimento
qual o mais gozar do sofrimento?
Entre razão e com-paixão
existe o devir-povo-da-nação.
Jomard Muniz de Britto
terça-feira, 30 de maio de 2017
POESIA DA PRESENÇA INVISÍVEL, poema de Joaquim Cardozo
Através do quadro iluminado da janela
Olho as grandes nuvens que chegaram do Oriente
E me lembro dos homens que seriam meus amigos
Se eu tivesse nascido em Cingapura.
E aqueles que estiveram comigo nas horas concluídas
Ainda impressionam o ar
— Todos eles perderam-se no mar.
Agora, na praia deserta estou sozinho
— Caminho
Com os pés descalços na areia.
Nesta tarde morta o perfume das almas
Invade as enseadas, estende-se sobre os rios, paira sobre as colinas
— A Natureza assume a precária presença de um sonho;
Um trem corre sereno na planície dos homens ausentes;
Do fundo de minha memória sobe um canto de guitarras confusas;
Sinto correr de minha boca um rio de sombra,
A sombra contínua e suave da Noite.
Joaquim Cardozo
segunda-feira, 29 de maio de 2017
O LOUCO, poema de Geraldino Brasil
Inventou que era deus e fez das
suas:
Óleos n´água pingou, criou aquarelas
Partiu uma maçã em duas luas
e cortou carambolas fez estrelas.
Quis ser o diabo e riu nos desatinos:
e riu caretas diante de dois cegos
Falou na história antiga a dois meninos
E da vida moderna a poetas gregos.
Chorou e o diabo o fez cortar cebolas
e lhe enxugou as lágrimas com lãs
de vidro e gritou puuum! com as suas artes.
Deus bondoso o acalmou com carambolas
que comeu e então fez duas manhãs
partindo uma laranja em duas partes.
Óleos n´água pingou, criou aquarelas
Partiu uma maçã em duas luas
e cortou carambolas fez estrelas.
Quis ser o diabo e riu nos desatinos:
e riu caretas diante de dois cegos
Falou na história antiga a dois meninos
E da vida moderna a poetas gregos.
Chorou e o diabo o fez cortar cebolas
e lhe enxugou as lágrimas com lãs
de vidro e gritou puuum! com as suas artes.
Deus bondoso o acalmou com carambolas
que comeu e então fez duas manhãs
partindo uma laranja em duas partes.
Geraldino Brasil
O que é o amor? (3)
Stendhal
"O amor é como a febre: Nasce e passa sem a
menor intervenção da vontade. Não há limite de idade para o amor."
(Stendhal, escritor
francês)
Para refletir (83)
John Locke
“Contra todo o poder político que exceda os seus
limites e ponha o arbítrio no lugar da lei, o povo tem o direito de recorrer à
resistência ativa e à força. Neste caso, a resistência não é rebelião porque é
antes a resistência contra a rebelião dos governos à lei e à própria natureza
da sociedade civil. O povo torna-se juiz dos governantes.”
(John Locke, filósofo inglês)
domingo, 28 de maio de 2017
Dicas para novos escritores e poetas: Quer saber se o que escreve está bom, como publicar, se vale a pena participar de concursos literários?
Por Fábio Rocha
São essas as perguntas que
mais vejo na internet. Tentarei responder com o que aprendi vida afora.
Primeiro, é preciso que você leia, como bem
lembrou um leitor desse site de Luanda, “o aspirante a poeta ou novelista deve
primar pelo domínio da língua (gramática) e possuir um certo grau de
vocabulário, que lhe advém de muita leitura.” (José Luís Mendonça) Sem isso, é
impossível escrever realmente bem. Correndo o risco de parecer óbvio, lembro
também a importância de reler o que você mesmo escreveu. A maioria imensa do
que recebo em meu curso de criação poética vem cheio de erros
básicos de Português.
Também considero importante o processo na escrita
poética (e na arte em geral). Recomendo a leitura desse post sobre Valdir Sarubbi para expandir seus
horizontes.
Dito isto, para saber o valor do seu texto, acho
o mais importante você mesmo gostar dele. Vai ter sempre gente que vai gostar e
gente que não vai gostar, mas o que importa mais é a sua própria opinião. Além
disso, ninguém sabe direito o que é ou não é arte. Logo, não valorizo os
críticos profissionais, assim como muitos poetas. Também questiono o valor do conhecimento
teórico para escrever poesia. Acho que podemos criar muito bem sem saber escandir, o que é uma redondilha, poesia concreta, a diferença entre haikai e poetrix, ou quem foi Bashô. Fazer uma faculdade de Letras também não me
parece uma condição necessária.
Uma dica que me deram quando
comecei e acho interessante é não se prender muito à forma do poema,
principalmente nos seus primeiros poemas. Temos a tendência a encher de rimas
ou se preocupar demais com a métrica quando começamos a escrever poesia. E o
essencial é a mensagem, o que você quer passar, o que tem a dizer. Porém sem
desleixo, sem escrever e nem ler e reler o que escreveu, sem se questionar
minimamente sobre o que quis dizer.
Além disso, como bem disse Bukowski em seu poema “Então queres ser escritor”,
é preciso ter o que dizer. O essencial é isso. E ter paixão por escrever. Rilke, em seu “Cartas a um jovem poeta” diz que “Basta
sentir que se poderia viver sem escrever para não mais se ter o direito de
fazê-lo.” Leminski dá outras dicas boas nesses vídeos. E Quintana, nesta carta. Não deixe de ler também essas cartas de Caio Fernando Abreu sobre o que é ser
escritor.
Quanto a escrever um livro, buscar editoras,
revistas e concursos literários, falo mais nesse post, onde também deixo um conselho de Rilke pra quem quer ser poeta. Bukowski também fala bem disso aqui. Em resumo, recomendo que faça um blog em vez de publicar um livro, que
aproveite a liberdade que a internet proporciona. Mas, se tiver aquele sonho de
um livro em papel, tome cuidado com editoras que só visam o lucro. Há várias
hoje em dia que não cobram nada de novos autores, se acreditarem em suas obras.
Antes de tudo, porém, registre seu livro na Biblioteca Nacional (Escritório de Direitos Autorais – EDA), como sempre fiz
com meus livros e e-books. Quanto aos concursos literários,
hoje em dia acho a mesma coisa do que os críticos… Vale mais é a importância do
escrever para você mesmo. Mas se quiser participar, atualmente há um blog sem
fins lucrativos que os está organizando e divulgando muito bem: http://concursos-literarios.blogspot.com.br/
Se ainda precisar uma ajuda mais personalizada,
se inscreva em meu curso de criação poética.
Um abraço e boa sorte!
sábado, 27 de maio de 2017
MÃOS QUE PENTEAVAM MEUS CABELOS, poema de Itárcio Ferreira
Gostaria muito de
poder andar, não posso.
Adoraria ser feliz,
não pude.
Frequentei os puteiros
de minha cidade natal,
Carpina.
Ganhava afagos, mãos
que penteavam meus cabelos,
refrigerantes.
Um frio percorria
minha barriga,
congelava meu sangue
nas veias,
apenas um sorriso
tímido conseguia esboçar.
Gostaria muito de
poder jogar futebol, não posso.
Adoraria trabalhar no
que me desse prazer, não pude.
sexta-feira, 26 de maio de 2017
Penélope às avessas, poema de Fátima Ferreira
Bordo as ondas do cais
O sol, qual serpente
enrolada no horizonte,
Fere o mastro de Brennand
Corro nas calçadas do
bordado
Quando ventos
enlouquecidos
Misto de maresia e cetim
Chegam nos corvos
fantasiados
Bordo o cheiro da chuva
Nas folhas de alecrim
E cachoeiras tranças na
menina
Vestida de por de sol
Subo as ribanceiras
Com os meninos verdes de
cola e fome
E nessa trama me perco nos
becos
Chego ao ponto alto
Maneira de viver
prisioneira
Dos arranha-céus, irmãos
dos pássaros
Esperança de um dia
A lei dos vencidos subir a
ladeira
Sem agulha, seda, nem
ponto-de-cruz
E as madames das academias
Com os medos presos nos
músculos
Amamentarem os dias
Com seios inúteis de
cirurgias
Bordo todos os dias o amor
Com o cordão das veias
E espero-te no abraço dos
rios.
Fátima Ferreira
quinta-feira, 25 de maio de 2017
BRASIL, um poema de Ton Paulo
É PM matando favelado e espancando mulher,
é fazendeiro matando índio e fazendo o que quer.
É pastor na casa de Deus pregando ódio e linchamento,
é fanático apoiando isso sem nenhum arrependimento.
É pobre se dizendo 'de direita', achando ser elite,
é deputado indo na TV pra dizer que "homofobia não existe".
É mulher agredida tentando falar sobre o machismo,
é gente raivosa dizendo que isso é "vitimismo".
É estudante espancado em protesto que o povo deveria estar apoiando,
é gente fazendo piada disso, torcendo pela morte dele, rindo, gargalhando.
É travesti sendo linchada com o povo olhando mas sem nada fazer,
é gente dizendo "bem feito, fez por merecer!".
É menor de idade saindo do útero pra prisão,
é gente defendendo chacina, "esse não tem recuperação".
É vice golpista governando, como se isso fosse natural,
é o trabalhador vendo seus direitos sendo extintos,
como se aquilo fosse algo "normal".
É assalariado pobre indo contra sua própria classe,
é patrão gostando disso, já não sentindo falta de um gado que ele manipulasse.
É político chamando negro de "vitimista",
é gente dizendo que isso é opinião, tudo bem ser racista.
É um país afundado no golpe, no preconceito, no ódio, na intolerância.
É um país sem luz no fim do túnel, inundado pela ignorância.
é fazendeiro matando índio e fazendo o que quer.
É pastor na casa de Deus pregando ódio e linchamento,
é fanático apoiando isso sem nenhum arrependimento.
É pobre se dizendo 'de direita', achando ser elite,
é deputado indo na TV pra dizer que "homofobia não existe".
É mulher agredida tentando falar sobre o machismo,
é gente raivosa dizendo que isso é "vitimismo".
É estudante espancado em protesto que o povo deveria estar apoiando,
é gente fazendo piada disso, torcendo pela morte dele, rindo, gargalhando.
É travesti sendo linchada com o povo olhando mas sem nada fazer,
é gente dizendo "bem feito, fez por merecer!".
É menor de idade saindo do útero pra prisão,
é gente defendendo chacina, "esse não tem recuperação".
É vice golpista governando, como se isso fosse natural,
é o trabalhador vendo seus direitos sendo extintos,
como se aquilo fosse algo "normal".
É assalariado pobre indo contra sua própria classe,
é patrão gostando disso, já não sentindo falta de um gado que ele manipulasse.
É político chamando negro de "vitimista",
é gente dizendo que isso é opinião, tudo bem ser racista.
É um país afundado no golpe, no preconceito, no ódio, na intolerância.
É um país sem luz no fim do túnel, inundado pela ignorância.
CANTIGA DO TOMARA, poema de Daniel Lima
As aves voam e as palavras.
Com o tempo, todos voamos.
Voo eu, tu voas, ele
voa. E nos dissipamos.
Vamos, vamos e vimos
choramos, rimos, sorrimos.
Sem saber porque nem como,
mal chegamos, e partimos.
Como? Por quê? Por onde?
E onde? E quando? E daí?
E o quê? E mais: com quê?
Para quê, se tudo é se?
Se tudo é se.
Deus quisera,
talvez possa, vamos ver,
tomara, espero, vejamos,
acho que sim, pode ser;
se é tudo assim no palpite
na torcida, só com a cara,
sem saber porque nem como,
eu quero voar... Tomara!
Daniel Lima
quarta-feira, 24 de maio de 2017
A luta amorosa com as palavras, por Mario Quintana
Nasci em Alegrete, em 30 de julho de 1906. Creio que foi a principal
coisa que me aconteceu. E agora pedem-me que fale sobre mim mesmo. Bem! eu
sempre achei que toda confissão não transfigurada pela arte é indecente. Minha
vida está nos meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula
que não fosse uma confissão. Há! Mas o que querem são detalhes, cruezas,
fofocas… Aí vai! Estou com 78 anos, mas sem idade. Idades só há duas: ou se
está vivo ou morto. Neste último caso é idade demais, pois foi-nos prometida a
eternidade.
Nasci do rigor do inverno, temperatura: 1 grau; e ainda por cima
prematuramente, o que me deixava meio complexado, pois achava que não estava
pronto. Até que um dia descobri que alguém tão completo como Winston Churchill
nascera prematuro – o mesmo tendo acontecido a Sir Isaac Newton! Excusez
du peu.
Prefiro citar a opinião dos outros sobre mim. Dizem que sou modesto.
Pelo contrário, sou tão orgulhoso que nunca acho que escrevi algo à minha
altura. Porque poesia é insatisfação, um anseio de auto-superação. Um poeta
satisfeito não satisfaz. Dizem que sou tímido. Nada disso! Sou é caladão,
introspectivo. Não sei por que sujeitam os introvertidos a tratamentos. Só por
não poderem ser chatos como os outros?
Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese.
Outro elemento da poesia é a busca da forma (não da fôrma), a dosagem das
palavras. Talvez concorra para esse meu cuidado o fato de ter sido prático de
farmácia durante 5 anos. Note-se que é o mesmo caso de Carlos Drummond de
Andrade, de Alberto de Oliveira, de Érico Veríssimo – que bem sabem (ou
souberam), o que é a luta amorosa com as palavras.
Mario Quintana
Revista “Isto É” de 14/11/1984.
terça-feira, 23 de maio de 2017
Um abrigo, poema de Carlos Maia
Um abrigo
Um lugar ao sol
Um empecilho
A força que
Nos move no planeta,
O absinto
A droga
E eu já não sinto
A vertigem
O luar
O orgasmo
A vontade de voar
Carlos Maia
Um lugar ao sol
Um empecilho
A força que
Nos move no planeta,
O absinto
A droga
E eu já não sinto
A vertigem
O luar
O orgasmo
A vontade de voar
Carlos Maia
Mural dos deuses, poema de Carla Andrade
Há o profano em
células
cume de ossos
em câncer
trópicos.
células
cume de ossos
em câncer
trópicos.
O eterno na esquina
no tráfego das mãos,
na romaria de dúvidas.
no tráfego das mãos,
na romaria de dúvidas.
O fogo de cupim:
no cérebro e sexo.
no cérebro e sexo.
Há babas do mar
em despedidas de trovões
ressaca de barcos
no veludo de vozes.
O humano a se render.
em despedidas de trovões
ressaca de barcos
no veludo de vozes.
O humano a se render.
Nos homens, a morte
imersa na arte.
Léxico dos deuses.
Sopro com sede
no inferno.
imersa na arte.
Léxico dos deuses.
Sopro com sede
no inferno.
Nos homens,
a pitada da ironia:
ser divino em pele de fungos,
em bactérias de dor,
em cascas do tempo.
a pitada da ironia:
ser divino em pele de fungos,
em bactérias de dor,
em cascas do tempo.
Carla Andrade
Assinar:
Postagens (Atom)