Aos Mestres, com carinho!

Aos Mestres, com carinho!
Drummond, Vinícius, Bandeira, Quintana e Mendes Campos

domingo, 12 de novembro de 2017

Para uma poética libertária. Pode haver poesia na pornografia e pornografia na poesia?

La femme damnée 
é um óleo sobre tela de autoria 
do francês Octave Tassaert 
e foi pintado em 1859.

Há, ainda, entre alguns, controvérsia sobre determinados temas serão ou não capazes de conter poesia. Um exemplo é: a pornografia pode ser poética? Dylan Thomas, poeta galês, disse certa vez: “poesia é aquilo que me faz rir, chorar ou uivar, aquilo que me arrepia as unhas do dedo do pé, o que me leva a desejar fazer isso ou aquilo, ou nada”. Não poderíamos dizer, portanto, que o gozo, o orgasmo, o fetiche ou tudo aquilo que possa dar prazer a isso ou aquilo, ou nada, seriam também temas poéticos?

Nossa sociedade tende a tornar antipoético tudo o que nossa moral condena. A morte, um dos maiores medos do homem e assunto que não agrada muitas conversas, foi tema de grandes poetas como Fernando Pessoa, Augusto dos Anjos, Florbela Espanca, Cecília Meireles. Não obstante, muitos poetas renomados também trataram do gozo, dos órgãos sexuais e das liberdades de gênero e sexualidade de forma poética: Aretino, Bocage, Alexandre O'Neill, António Botto, E. M. de Melo e Castro, Hilda Hilst, Glauco Mattoso. Mas por que os cadernos literários aceitam como poesia apenas o dito erotismo velado? Se o horror da guerra com corpos mutilados e terras ensanguentadas pode ser um tema retratado da forma mais bela, ainda que cause indignidade e repulsa, não pelo autor da obra, mas por aqueles capazes de tal monstruosidade, por que não as taras sexuais e suas formas mais belas ou horrendas?

O sexo dos outros é feio e condenável, e a isso chamamos pornografia. Essa é uma realidade ainda latente em muitos cantos do mundo. Não adianta o quanto dissermos ser liberais, libertinos ou despudorados, a moral no século XXI ainda condena a nudez e as práticas sexuais. Não importa se “Cinquenta Tons de Cinza” se tornou um bestseller em todo o mundo, o sexo ainda é tabu que revira olhares quando ouvido no metrô, na praça de alimentação de um shopping, em uma conversa de família, ou, ainda, se nas redes sociais escapam alguns biquinhos de seios em uma foto.

Nesse contexto, um poeta brasileiro chamado Vinni Corrêa vem esforçando-se com sua obra para que o mundo literário aceite o linguajar tido como pornográfico também como possível no campo poético. O autor comenta que um poeta jamais poderia condenar qualquer que seja a palavra uma vez que não é aceitável arbitrariedade na língua no fazer poético. Ao contrário, a palavra deve ser extrapolada e alcançar níveis além daqueles impostos pela comunicação cotidiana. “Concordo quando Boris Vian afirmou que a pornografia existe para aquele que a procura e que a enxerga mesmo onde ela não há. A palavra não define a poesia, pois é a poesia que rompe com as raízes da palavra, permitindo que uma semente de abacaxi gere uma pedra de diamante ou uma lava de um vulcão”.

Vinni Corrêa nasceu em 1981, no Rio de Janeiro, e é autor de três livros de poesia erótica: “Coma de 4”, de 2012, “Literatura de Bordel” e “Lunch Box”, ambos de 2015. Está previsto para o final de 2017 seu quarto livro, “Sexo a Três”. O poeta organiza em sua cidade o sarau “Fresta Literária – sarrau de poesia erótica”, promovendo a poesia erótica. Abaixo, alguns poemas de Vinni Corrêa:

Gozo Sincronizado, do livro Coma de 4

Ambos os lábios se tocam
As mãos dele apalpam os seios dela
As mãos dela alisam os mamilos dele
As dela descem para o pênis
As dele descem para a vagina

Tocam-se
Umedecem

Juntos sussurram um no ouvido do outro
Os dedos falam uma mesma língua
As pernas os mesmos sinais entrelaçados
Num vaivémvemvai do corpo
Suando gemidos por toda a pele
Contorcem como em uma dança
A língua dele baila no minete
A língua dela valsa no broche
A dela engole o jorro
A dele também


Fio Solto, do livro Coma de 4

Um fio
Solto
Decai
Certeiro
Na linha da
Curva do
Ânus
O fio
Espiralado
Cocegando
O esfíncter
Estreitinho
Da bela menina
Que no
Sono
Fantasia
A piroca
Mais grossa
Penetrando
O seu
Cu


Por Que Não as Panturrilhas?, do livro Coma de 4

Por que são as bundas
Bundas bundas bundas e bundas
E os peitos
Peitos peitos peitos e peitos
Femininos
A chamarem mais a atenção dos homens?
Por que não os joelhos
Redondinhos dobradiços
Para ela rezar para ela felar?
Por que não os tornozelos
Onde os finos - dizem
São daquelas que dão boa comida?
Por que não as orelhas
Pequeninas conchinhas
Lubrificadas com o marulho das palavras?
Por que não os cabelos
Lisos crespos encaracolados
Perfumados e a grudar no corpo no suor do sexo?
Por que não as panturrilhas
Brilhantes reinantes em uma meia-calça
Que a leve mão desliza até as coxas?


Quando Beijo Tua Boca, do livro Coma de 4

Quando beijo tua boca
Toda nua feito quando
Beijo tua boca
Toda nua feito beijo
Tua boca
Toda nua feito tua
Boca
Toda nua feito boca


A Cereja do Bolo, do livro Coma de 4

Por que querer ser a cereja do bolo se tu mulher podes ser o fiapo de manga em minha boca?


Sem Rodeios, do livro Coma de 4

A menina foi à tourada
E impressionou-se com o bovídeo peniano
Diante de toda a gadaria
Pareceu manso e inofensivo o bichano
Então montou ela naquela corcova
Alisando o duro couro
Empinada a anca rebolava fogosa
Empolgava e dominava o Deus Touro
Ela trepada e ele bufando
Na faena
O bicho agitou agitou agitou
Ela cambaleava no meio da arena
Debatia-se em espasmos
Na lide da tourada
Já que touro alvo
A prenda fora derrubada


tem culpa eu?, do livro Literatura de Bordel

cu é cego, não tem culpa.
não tem deuses, não tem templo.
não tem razão, não tem culpa.
mas quem dá o seu de exemplo?


licitação licenciosa, do livro Literatura de Bordel

ela pôs a virgindade
para venda no leilão.
as pregas, com pouca idade,
já anunciava pregão.


autosomagrafia, do livro Literatura de Bordel

o poeta é um gozador.
goza tão abertamente
que chega a gozar com dor,
a dor que o cabaço sente.


vida fácil, do livro Literatura de Bordel

prostituta é um ofício
difícil de labutar.
vai batente em orifício
que não dá pra lá botar.


rosa bebê, do livro Literatura de Bordel

tão rosada essa bochecha,
dá vontade de apertar.
mas é mesmo uma boceta
que faz meu pau corar.


o galanteio, do livro Literatura de Bordel

um galo, bom ciscador,
botou no cu da galinha
um cisco tão varador,
que de gala a pôs pra rinha.


karma sutra, do livro Literatura de Bordel

uma estranha sensação
de que já vi este cu.
ou de outra encarnação,
ou é mero deja vu.


violeta, do livro Literatura de Bordel

no letreiro do bordel,
pisca nome em luz neon.
escrevi-o num papel
cor lilás do seu batom.


essência, do livro Lunch Box

o cheiro que te perfuma
tem meu sexo
na assinatura


meia-verdade, do livro Lunch Box

meia-verdade é uma cinta-liga
nas pernas de um travesti


a nova mulher, do livro Lunch Box

750 ml de silicone
nos seios e 30 cm
de prótese na cona


pagando de voyeur, do livro Lunch Box

a transa
quanto custa
se for a vista?


medida do amor, do livro Lunch Box

todo o seu peso
em cima do meu corpo
me dá a leveza
de estar no topo


estética, do livro Lunch Box

até uma deusa
como Afrodite
tinha celulite


erosão, do livro Lunch Box

minha cachoeira
tem uma queda
pelo seu lago


descobertos, do livro Lunch Box

apaga-se a luz
nossos corpos nus
se sombra de dúvida


masturbador, do livro Sexo a Três

poeta de boa escrita
nunca escreve “punheta”
palavra já muito batida


a casa-lar, do livro Sexo a Três

suas arqui tetas
desenham a morada
onde ponho mãos à obra


beijo persa, do livro Sexo a Três

no tapete do seu corpo
eu voo
por linguadas


CEP, do livro Sexo a Trê

as putas de rua
têm mais endereço fixo
que o meu coração


Mais sobre o autor:

Vinni Corrêa
Sobre Vinni Corrêa: pós-graduando em Psicanálise e Ciências Humanas, pós-graduado em Marketing e Comunicação Empresarial, graduado em Comunicação Social (ênfase em Jornalismo).


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Assessoria Literária
Julia Antunes Braga