Aos Mestres, com carinho!

Aos Mestres, com carinho!
Drummond, Vinícius, Bandeira, Quintana e Mendes Campos

terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

MANUAL DO HOMEM COMUM, poema de Itárcio Ferreira

Imagem daqui


Falar baixinho,
incessantemente,
pois é tão agradável aos ouvidos e à percepção.
Sorrir, que é mostrar a alma ao próximo.
Dar bom dia,
o que tem a força de mil vulcões.
Olhar nos olhos e se ver no outro:
o outro vendo-se em você.
Ceder a vez,
sempre que necessário:
a pressa é inimiga da pressão.
Não ter certezas,
pois são tantas as dúvidas
e é tão grande o ego.
Ser tolerante, uma utopia?
Sejamos teimosos,
tentemos ao menos.
Respeitar os idosos,
que são mais sábios que nós
e o nosso reflexo daqui a instantes.
Indignar-se com a injustiça,
pois a ganância de poucos a alimenta.
Odiar as bombas que nada constroem.
Amar as flores que enfeitam nossos olhos.
Acariciar o cão
com a mesma intensidade com que eles nos acariciam.
Emocionar-se com uma velha canção
regressando ao passado
e tornando o presente dançante.
Compartilhar os livros,
pois fechados os mesmos apodrecem
qual o alimento não consumido.
Escutar, ouvir,
que são sinônimos de sabedoria.
Se preciso, opinar, sem pressas, sem vaidade.
Não reter conhecimentos qual um muquirana.
Amar, até as últimas consequências, a paz,
que tudo constrói.
Evitar, até a morte, a guerra,
que é sinônimo de mortes.
Plantar e dividir o fruto com o próximo.
Regar comunitariamente.
Colher junto com outras mãos
e assim formar uma corrente que liberta.
Soltar os pássaros das gaiolas
e vê-los bailar sob a liberdade.
Libertar os animais dos circos e zoológicos,
que como nós, odeiam as prisões.
Respeitar as diferenças:
sempre, incansavelmente, obstinadamente.
Ser uno, mas divisível.
Ser paradoxal, mas convergente.
Ouvir Beethoven e Spock.
Amar os gays e os não gays.
Ser feminista,
indo ao encontro afável de nossa metade mulher.
Ser negro, índio, amarelo
e buscar na miscigenação o orgulho de sermos iguais.
Ser deficiente,
e na medida do possível cooperar com a sociedade.
Um pedido pessoal:
abram as portas dos banheiros aos cadeirantes:
dos bares, dos hotéis, dos motéis,
afinal também somos boêmios, viajantes e amantes.
Ler que é viajar com o pensamento.
Inventar,
buscando a excelência do servir
a quanto mais gente melhor.
Viver,
pois não temos outra saída
e às vezes é bem gozoso.
Dar as costas às culpas e aos pagamentos,
excluindo as cobranças das religiões e dos banqueiros.
Não temer a morte
que é o caminho reto da vida.
Não temer,
principalmente,
a plenitude da vida em acolhimento.